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Tô grávida, e agora?

13/04/2020

O projeto “Tô grávida, e agora?” tem como objetivo reunir adolescentes e jovens grávidas e/ou mães em contextos de vulnerabilidade social, como em situação de rua e moradoras de ocupações, bairros periféricos e favelas, para conversar sobre experiências de gravidez e maternidade, disponibilizar informações sobre o tema e pensar estratégias de acesso a direitos e cuidados em saúde.

Em abril de 2019, o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) voltou a alertar sobre o alto índice de gravidez na adolescência no Brasil. No país, a taxa é de 62 adolescentes grávidas para cada mil jovens do sexo feminino com idades entre 15 e 19 anos. Esse índice é igual ao da América Latina e Caribe (62) e maior do que a taxa mundial (44). Nas regiões mais desenvolvidas, a taxa de fecundidade na adolescência é de 14, enquanto nos países menos desenvolvidos, a média é de 91. Além de problemas de saúde para as gestantes e para os próprios bebês, a gravidez na adolescência traz implicações sociais importantes. Quando ocorre em contextos de vulnerabilidade, como é o caso das ruas, a gravidez e a maternidade tornam-se ainda mais desafiadoras, assim como questões importantes para o campo das políticas públicas.

Foi com essa preocupação em mente que, no segundo semestre de 2016, foi dado início ao projeto “Tô grávida, e agora? – Vozes de jovens em contextos de vulnerabilidade”, uma parceria entre o Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância (CIESPI/PUC-Rio) e a Associação Beneficente São Martinho. Até o presente momento, foram executadas três fases nesse projeto. Na primeira, ocorreram encontros com adolescentes grávidas e/ou mães, visando uma aproximação com o tema, e foi produzido o filme “Tô grávida, e agora?”.

Na segunda fase do projeto, no segundo semestre de 2017, foi reunido um grupo de adolescentes e jovens grávidas e/ou mães com trajetória de vida nas ruas, para conversar, em rodas de conversa temáticas como: “Gênero e Afetividade”, “Educar sem Violência”, “Exercício da Maternidade e da Paternidade”, “Conflito com a Lei”, “Exercendo Direitos”, “Saúde da Mulher”, “Aleitamento”, “Primeiros Cuidados” e “Sexo e Drogas”, de modo a estimular a participação das jovens nos debates. Para trabalhar os temas de saúde foram convidados profissionais especialistas que compõem a rede de serviços que atende a esta população.

No segundo semestre de 2018, na terceira fase do projeto, foi realizada uma pesquisa de campo na qual foi analisado o perfil das participantes do projeto e buscou-se identificar outras participantes em potencial.

Quais eram os atores envolvidos e qual o papel de cada um?

O projeto é realizado por pesquisadores da PUC-Rio, com apoio da Associação Beneficente São Martinho, direcionado a mães em situação de vulnerabilidade social, e contou com articulação junto a profissionais da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro. Além do time de pesquisadoras contratadas, o CIESPI/PUC-Rio sempre mantém estagiárias/os de Serviço Social em seus projetos. Nesse caso, as estagiárias participaram de todas as etapas do projeto, contribuindo com sugestões e aprendendo sobre planejamento, desenvolvimento de pesquisa e execução de trabalho de campo. Foram envolvidas 6 alunas de graduação.

Como se deu o planejamento e a execução das atividades?

Durante os encontros, realizados uma vez por semana, as gestantes participam de rodas de conversa para troca de experiências, recebem atendimento técnico e encaminhamentos diversos, além de uma ajuda de R$ 15 de auxílio passagem e um kit de cuidados para as mães e os bebês. As atendidas pela iniciativa estão em situação de rua ou vivem em ocupações urbanas, são extremamente pobres e recebem recursos de programas governamentais de distribuição de renda.

Quais os resultados alcançados?

A iniciativa beneficiou diretamente 18 crianças de 0 a 3 anos, quatro crianças de 4 a 6 e dez gestantes. O diferencial do “Tô grávida, e agora?” é em relação à construção de vínculos e o acompanhamento mais aprofundado das histórias de vida das jovens, por ser um grupo pequeno. Essa configuração permitiu um desenvolvimento mais cuidadoso dos conteúdos e uma participação mais ativa das adolescentes e jovens. Em 2017, foram realizadas 13 oficinas de direitos sociais e saúde, uma exposição itinerante e permanente chamada “Bastidores”, a produção de um folder, um vídeo e um seminário de apresentação dos resultados do projeto para toda a rede de proteção que contou com cerca de 100 pessoas.

Com base no projeto, desenvolvido em parceria com a Associação Beneficente São Martinho, foram produzidos 2 vídeos sobre o tema da gravidez e da maternidade em contextos de vulnerabilidade, ambos amplamente divulgados, buscando sensibilizar atores-chave no campo das políticas públicas em vários setores, assim como pesquisadores e profissionais que trabalham com a questão. Um dos vídeos, lançado em 2017, alcançou o primeiro lugar no concurso “Posso Falar?”, promovido pela Rede Rio Criança. Foi realizada também uma exposição de fotografias, chamada “Bastidores”, lançada em um evento que contou com a participação de mais de 200 adolescentes e jovens para trocar experiências e conversar sobre os temas gravidez e maternidade. Foi elaborado também um material educativo que sistematiza os principais conteúdos trabalhados na série de oficinas promovida no âmbito do projeto. Além disso, foi realizada uma pesquisa através da qual foi possível conhecer o perfil das participantes do projeto, todas adolescentes e jovens moradoras de ocupações ou das ruas do centro da cidade do Rio de Janeiro. Também foi lançado o Caderno de Pesquisas e Políticas Públicas n°7 (CIESPI/PUC-Rio, 2019) que traz os resultados dessa pesquisa e subsidia nossas ações e discussões do tema com profissionais e atores que tratam da questão.

Quais foram os fatores críticos de sucesso?

“A parceria entre o CIESPI/PUC-Rio e a Associação Beneficente São Martinho certamente foi fundamental para a realização do projeto. A equipe de trabalho composta por estudantes e profissionais de ambas as organizações reuniu um conjunto de habilidades, tanto de pesquisa quanto de atendimento de grupo e individual às adolescentes e jovens que experimentam contextos de vulnerabilidade, que permitiu que o projeto avançasse. A interlocução com outros atores do Sistema de Garantia de Direitos, sobretudo da área da saúde, também foi muito importante”, afirma Cristina Bó, do CIESPI.

Quais foram as lições aprendidas?

“Projetos que envolvem mães, sobretudo de crianças na Primeira Infância, precisam garantir que os filhos das participantes tenham um espaço próprio, com atividades planejadas. É preciso também incorporar no planejamento atividades que atendam às expectativas das participantes e despertem seu interesse em seguir integrando o grupo. No caso deste projeto, em que foram envolvidas jovens que vivem em contextos de vulnerabilidade, trabalhar habilidades ou temas que contribuam para o desenvolvimento de estratégias de geração de renda nos pareceu importante. No planejamento, e ao longo de sua execução, buscamos captar as demandas das participantes e reorganizar as atividades propostas incluindo, por exemplo, um encontro que visava aproximar seus companheiros e familiares das discussões. Conhecer o campo onde se pretende intervir e contar com parceiros com experiência e laços pré-estabelecidos com o público-alvo do projeto, no caso a participação ativa de assistentes sociais e educadores sociais da São Martinho, contribuíram para uma melhor adesão às atividades” afirma Cristina Bó, do CIESPI.

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